18/09/2025, 01:30
Autor: Ricardo Vasconcelos
A recente renúncia de um dos cofundadores da famosa marca de sorvetes Ben & Jerry's, Ben Cohen, após 47 anos de trabalho, acendeu uma discussão sobre a ética empresarial e a interferência corporativa no ativismo social. A decisão de Cohen ocorreu em um contexto em que ele expressou preocupações sobre a Unilever, a empresa controladora, que assumiu o controle da Ben & Jerry's em 2000, mas que agora estaria restringindo o espaço para o ativismo que sempre fez parte da essência da marca.
Cohen, conhecido por suas fortes convicções em relação à justiça social e igualdade, sente que a recente mudança na gestão da Unilever impactou as práticas que ele e seu sócio, Jerry Greenfield, estabeleceram desde o início da Ben & Jerry's. A marca é amplamente reconhecida por sua postura ativista ao longo dos anos, defendendo causas como direitos civis, justiça climática e, mais recentemente, apoio ao povo palestino. A pressão para se alinhar a decisões corporativas conservadoras parece ter sido o estopim para a decisão de Cohen em deixar a empresa, um símbolo do que muitos vêem como a incompatibilidade entre o capitalismo agressivo e o ativismo genuíno.
Os comentários de apoio à saída de Cohen nas redes sociais refletem uma crescente frustração com a forma como grandes corporações tratam valores individuais e sociais. Um dos comentários destaca que a "ameaça de perder o emprego é uma coleira invisível" que impede muitos de se expressar. Este sentimento ressoa com a realidade em que muitos ativistas enfrentam diversas formas de repressão por parte de suas respectivas instituições, cujos interesses financeiros frequentemente se sobrepõem a causas sociais.
Recentemente, Cohen foi preso durante um protesto exigindo mais apoio para Gaza, e a Unilever rapidamente se distanciou das ações dele, alegando que estas não representavam a empresa. Essa ação parece contradizer a ideia de que as corporações devem permitir vozes autênticas dentro de suas estruturas e levanta questões sobre a real capacidade de agir de maneira socialmente responsável sem enfrentar represálias. Esse descompasso entre as intenções das fundações e as diretrizes corporativas é um tema giratório no atual mercado, especialmente à luz do crescente ativismo social e da demanda por responsabilidade.
A resistência ao ativismo em grandes empresas não é inédita. Muitos observadores já alertaram que a natureza do capitalismo, por vezes, cria um ambiente hostil para a empatia e o progresso social. A pergunta se intensifica sobre como marcas que tradicionalmente se posicionaram como defensoras de causas sociais podem sobreviver à pressão de interesses financeiros que preferem o silêncio a uma postura assertiva.
Em um contexto mais amplo, a retirada de Cohen coincide com um movimento global mais amplo que encoraja os consumidores a fazer escolhas éticas e a exigir uma maior transparência das corporações em suas práticas. Marcas que se distanciam de seus valores autênticos por razões financeiras enfrentam uma crescente pressão do consumidor, que não quer mais apoiar empresas que não se alinham com suas crenças sociais e éticas. Este cenário atual lança luz sobre a necessidade de um novo modelo de sucesso empresarial que não apenas busque o lucro, mas que também incorpore valores éticos e sociais.
A história de Ben Cohen se torna um testemunho de como os princípios éticos e o ativismo podem entrar em conflito com o pragmatismo do mundo dos negócios. O desafio agora é ver como as novas gerações de empresários, que não só desejam lucrar, mas também impactar positivamente a sociedade, irão navegar por essas águas turbulentas. O legado de Ben & Jerry's e seus cofundadores continua a inspirar debates sobre a verdadeira natureza do sucesso – deve ser medido apenas em termos de lucro, ou também na capacidade de fazer a diferença em um mundo em necessidade de mudança.
À medida que a sociedade evolui, a expectativa de que as empresas se posicionem e ajudem a moldar o futuro está em alta. A renúncia de Cohen pode ser um catalisador para uma conversa mais ampla sobre o papel que as corporações devem assumir em questões sociais. Em tempos onde a apatia encontra resistência, histórias como a de Cohen lembram que a coragem pode prevalecer sobre o conformismo, e que a luta por justiça e igualdade continua sendo um valor central que deve ser defendido, mesmo em face da adversidade corporativa.
Fontes: Folha de São Paulo, The Guardian, Bloomberg
Detalhes
Fundada em 1978 por Ben Cohen e Jerry Greenfield, a Ben & Jerry's é uma marca de sorvetes famosa por seu compromisso com o ativismo social e a justiça ambiental. A empresa é conhecida por apoiar causas como direitos civis, justiça climática e, mais recentemente, questões relacionadas ao povo palestino. Desde 2000, a marca é controlada pela Unilever, o que gerou debates sobre a compatibilidade entre os valores da Ben & Jerry's e as práticas corporativas da gigante multinacional.
Resumo
A renúncia de Ben Cohen, cofundador da Ben & Jerry's, após 47 anos, gerou um debate sobre ética empresarial e ativismo social. Cohen expressou preocupações sobre a Unilever, controladora da marca desde 2000, que estaria limitando o ativismo que caracteriza a empresa. Ele, conhecido por suas convicções em justiça social, acredita que as recentes mudanças na gestão da Unilever impactaram os princípios estabelecidos por ele e Jerry Greenfield. A Ben & Jerry's é reconhecida por seu ativismo em causas como direitos civis e justiça climática. A saída de Cohen reflete uma frustração crescente com a forma como grandes corporações lidam com valores sociais, especialmente após sua prisão em um protesto em apoio a Gaza, que a Unilever desaprovou. Essa situação levanta questões sobre a capacidade das empresas de agir de forma socialmente responsável sem enfrentar represálias. A história de Cohen destaca o conflito entre ética e pragmatismo nos negócios, enquanto um movimento global clama por maior transparência e responsabilidade das corporações.
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