29/12/2025, 02:13
Autor: Ricardo Vasconcelos

A questão da desigualdade econômica entre países está longe de ser uma nova discussão, mas um recente estudo provoca debates acalorados ao afirmar que os 50% mais pobres da China têm um patrimônio líquido superior ao dos 50% mais pobres dos Estados Unidos, quando ajustado pelo poder de compra. Essa realidade complexa desmistifica a noção de que a prosperidade ocidental é um reflexo direto do bem-estar financeiro em todas as camadas da sociedade. O estudo traz à tona a necessidade de olhar mais de perto para as nuances dentro de cada sistema econômico, abordando como o acúmulo de riqueza é medido e quais fatores influenciam as economias dos dois países.
Os dados revelam que, mesmo entre os indivíduos mais modestos da China, aproximadamente 70% de seus ativos estão ligados ao mercado imobiliário. A posse da terra na China é complexa, uma vez que os indivíduos não podem realmente possuí-la, mas podem se tornar proprietários de direitos sobre a propriedade. A valorização desses ativos, que aumentaram mais de 400% entre 2000 e 2020, explica em parte por que mesmo os menos favorecidos economicamente possuem um patrimônio líquido considerável, embora o acesso a esse patrimônio possa ser limitado sem a venda de propriedades.
Além disso, um aspecto importante é a diferença em como a riqueza é medida entre os dois países. O conceito de patrimônio líquido — que é a diferença entre o que uma pessoa possui e o que deve — pode oferecer uma visão distorcida quando não se considera outros fatores cruciais, como renda ou custo de vida. A análise sugere que muitos dos mais pobres nos EUA podem estar enfrentando dívidas substanciais, o que compromete seu patrimônio líquido, enquanto os chineses, em muitos casos, acumulam economias sem recorrer ao crédito. Em 2020, por exemplo, mesmo com a pandemia, o patrimônio líquido dos mais pobres na China permaneceu inalterado, embora suas rendas tenham caído devido às restrições de lockdown.
Os investimentos em propriedades se tornam a norma na sociedade chinesa, onde o ato de possuir uma casa é culturalmente significativo e, frequentemente, a única forma segura de investimento disponível. Um comentário relevante destacou que, embora o patrimônio líquido possa ser elevado, ele não garante uma flexibilidade financeira real, já que acessar esse dinheiro muitas vezes requer a venda de ativos, um processo que pode ser complicado ou inviável para muitos.
A comparação entre os estilos de vida dos consumidores chineses e americanos também se torna evidente em seus padrões de consumo. Dados apontam que, enquanto 21% dos gastos dos consumidores chineses vai para alimentos, esse número é significativamente menor nos Estados Unidos, onde apenas 7% dos gastos são destinados a essa categoria. Tal diferença contribui para o debate sobre se a forma de gastar e poupar é indicativa de um nível de vida mais elevado ou inferior.
Outro fator a ser considerado é a diversidade nas experiências de vida das populações mais pobres em ambos os países. Enquanto muitos dos menos favorecidos na China podem ser camponeses que cultivam sua própria comida, os menos favorecidos nos EUA são majoritariamente urbanos e enfrentam altos custos com habitação, serviços médicos e diversas despesas fixas que corroem suas rendas. Essa dinâmica complexa é fundamental para entender as disparidades no que se refere à riqueza e ao consumo.
O sentimento sobre essa questão é polarizado, com críticas de ambos os lados sobre a representação das condições econômicas. Alguns veem os dados como uma tentativa de propaganda que ignora a realidade das dificuldades enfrentadas por muitos na China, enquanto outros reclamam que esses números contradizem narrativas convencionais sobre a superioridade do modelo econômico americano.
Além disso, a questão da pandemia e suas repercussões econômicas não pode ser subestimada. A resposta da China à COVID-19, que incluiu a manutenção da maior parte da economia ativa e desenvolvimento de infraestrutura ao longo das restrições, se contrasta com as dificuldades financeiras enfrentadas por muitos americanos. De fato, muitos analistas acreditam que esse cenário pode ter efeitos duradouros na dinâmica econômica global, especialmente à medida que as economias tentam se recuperar.
Esses dados e suas implicações chamam a atenção para o fato de que comparações econômicas não são simples e exigem uma análise cuidadosa. Um entendimento detalhado das diferentes culturas de consumo, dos modelos econômicos e das prioridades sociais pode fornecer insights mais profundos sobre as realidades económicas que moldam as vidas das pessoas na China e nos Estados Unidos. Portanto, a avaliação do bem-estar e da riqueza vai muito além de números isolados e exige um entendimento mais amplo das complexas interações que definem cada sociedade.
Fontes: The Economist, World Bank, International Monetary Fund
Resumo
Um estudo recente revela que os 50% mais pobres da China possuem um patrimônio líquido superior ao dos 50% mais pobres dos Estados Unidos, quando ajustado pelo poder de compra. Essa descoberta desafia a ideia de que a prosperidade ocidental se reflete em todas as camadas sociais. Na China, a maior parte dos ativos dos indivíduos mais modestos está vinculada ao mercado imobiliário, onde a valorização de propriedades aumentou mais de 400% entre 2000 e 2020. No entanto, a posse da terra é complexa, pois os indivíduos não podem realmente possuí-la. A análise também destaca que a forma como a riqueza é medida pode distorcer a realidade, já que muitos americanos enfrentam dívidas que comprometem seu patrimônio líquido. Além disso, os padrões de consumo diferem, com os chineses gastando uma maior proporção de sua renda em alimentos. A diversidade nas experiências de vida entre os pobres nos dois países, bem como as repercussões econômicas da pandemia, são fatores cruciais para entender as disparidades de riqueza e consumo.
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