Sem-teto versus sem-moradia traz novas discussões sobre linguagem e culpa

Discurso em torno dos termos sem-teto e sem-moradia revela estigmas sociais e uma busca por responsabilidades na crise habitacional moderna.

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27/09/2025, 09:56

Autor: Laura Mendes

Uma imagem vibrante de uma cidade contemporânea, mostrando pessoas em situação de rua com diferentes cenários; uma pessoa sentada com um cartaz de ajuda, outra na calçada com algumas roupas, e alguém abrigado em um espaço improvisado. O fundo deve incluir prédios e sinais de urbanização crescente, contrastando as realidades sociais em um dia ensolarado.

A discussão sobre a terminologia relacionada à situação de pessoas em condição de vulnerabilidade habitacional ocupa um espaço crescente no debate público. Palavras como "sem-teto" e "sem-moradia" não são meras diferenças semânticas; elas carregam implicações profundas sobre a percepção e o tratamento de indivíduos que enfrentam a falta de um lar. No cotidiano, essas expressões podem influenciar a forma como a sociedade vê e, consequentemente, trata quem se encontra nessa condição.

O termo "sem-teto" frequentemente sugere uma responsabilidade pessoal sobre a situação. Ele pode acarretar uma conotação negativa, insinuando que a pessoa em questão falhou em manter um abrigo adequado. Muitas vezes, a palavra é utilizada em contextos que reforçam estigmas, levando a uma visão de que a situação de ausência de um lar é resultado de escolhas individuais. Por outro lado, o termo "sem-moradia" é visto como uma expressão que sugere uma estrutura social ou um sistema falho que não conseguiu fornecer abrigo. Essa abordagem poderia, portanto, promover uma reflexão mais crítica sobre a responsabilidade coletiva pela crise de moradia.

Os comentários de cidadãos engajados neste tema ressaltam uma distinção crucial: enquanto "sem-teto" é muitas vezes associado a uma condição de hipossuficiência, "sem-moradia" expõe a fragilidade de um sistema de suporte comunitário e político. O uso da expressão "sem-moradia" vislumbra um quadro em que a falta de moradia é vista como um reflexo de falhas institucionais, não apenas de escolhas pessoais. Essa diferença pode parecer subtil, mas possui um impacto significativo na maneira como se formulam políticas públicas e se destinam recursos para tratamento e assistência a essas populações.

Além disso, a evolução das palavras que usamos para descrever esses grupos é um fenômeno linguístico, conhecido como "esteira de eufemismos". Como discutido por algumas das vozes mais críticas, termos que uma vez foram considerados aceitáveis ou neutros frequentemente se tornam estigmatizados ao longo do tempo. O linguista e filósofo George Orwell já discutiu em seus escritos a utilização da linguagem como ferramenta de manipulação social. O que antes era "mendigo" se transformou lentamente em "sem-teto", e, agora, "sem-moradia" sugere uma tentativa de desviar a carga negativa desses rótulos.

A prática de mudar terminologias também é observada em outros contextos sociais. O uso de eufemismos, como "pessoa com deficiência" ao invés de "deficiente", é um exemplo de tentativa de criar uma terminologia mais neutra e inclusiva. Contudo, há quem argumente que essas mudanças não abordam o problema real — a desigualdade social — e que focar na terminologia pode ser um desvio da verdadeira necessidade de ações que melhorem a qualidade de vida das pessoas afetadas.

Uma voz que se destacou nas discussões mencionou a diferença nas conotas emocionais associadas a "lar" e "casa". Enquanto "casa" pode ser vista como uma mera estrutura, "lar" carrega um significado emocional mais profundo; este conceito pode ser fundamental para entender por que a terminologia usada importa. Para muitos, uma casa sem um sentido de lar é apenas um abrigo temporário, e as duas expressões não são intercambiáveis. Assim, o dilema linguístico também reflete uma realidade emocional complexa, onde pessoas se sentem desconectadas da própria identidade devido à forma como são rotuladas.

Embora a terminologia seja um ponto de partida para o debate, uma análise mais ampla sugere que o melhor enfoque deve ser a ênfase em ações e políticas que realmente abordem as necessidades de quem se encontra em situações de vulnerabilidade. Estudos mostram que a erradicação da falta de moradia deve ser acompanhada de medidas que garantam acesso a tratamento psicológico, apoio social e políticas habitacionais mais inclusivas. Quando a sociedade foca no rótulo ao invés da substância, corre o risco de desviar a atenção do que é realmente necessário para promover a dignidade e o bem-estar dos cidadãos.

A problemática da falta de moradia, portanto, exige um diálogo sincero e respeitoso que ultrapasse a mera escolha de palavras. Por um lado, a linguagem é uma ferramenta poderosa que pode promover inclusão e empatia, mas, por outro lado, a dependência excessiva dela pode levar a superficialidades e a uma falta de ação real. Assim, o debate não deveria se limitar a "sem-teto" versus "sem-moradia", mas se estender a uma reflexão sobre como a sociedade pode melhor lidar com as complexas causas da condição habitacional atual. A transformação da realidade das pessoas em situação de rua requer um compromisso coletivo, que vai além das palavras e que se reflete diretamente em ações e políticas efetivas de mudança.

Fontes: Folha de São Paulo, O Globo, El País, The Guardian

Resumo

A terminologia relacionada à vulnerabilidade habitacional está em crescente debate público, com termos como "sem-teto" e "sem-moradia" carregando implicações significativas sobre a percepção e tratamento das pessoas sem lar. O termo "sem-teto" sugere responsabilidade pessoal, enquanto "sem-moradia" aponta para falhas estruturais na sociedade. Essa distinção é crucial, pois influencia a formulação de políticas públicas e a alocação de recursos. A evolução da linguagem, descrita como "esteira de eufemismos", mostra como termos anteriormente neutros podem se tornar estigmatizados. Além disso, a discussão destaca a diferença emocional entre "casa" e "lar", refletindo a complexidade da identidade das pessoas afetadas. Embora a terminologia seja importante, o foco deve ser em ações concretas que garantam dignidade e bem-estar, abordando as causas profundas da falta de moradia. O diálogo deve ir além das palavras, promovendo um compromisso coletivo para mudanças efetivas.

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